1.1 – A importância do estudo do arco elétrico
O arco elétrico em um dos fenomenos eletro-físicos mais destrutivos que se tem conhecimento em um sistema de potência. Seus impactos podem levar a graves ferimentos de pessoas, bem como dispendiosos danos a equipamentos e longas paradas de produção.
Acidentes de arco podem acontecer por diversos motivos; como erros humanos, conexões ruins, animais passando pelo sistema e etc. Por esse motivo, é fundamental construir uma solução de segurança robusta que funcione sempre de modo a reduzir ou evitar os impactos causados por esses possíveis acidentes. Dentro desse cenário de redução de impacto, além das proteções convencionais existem as proteções ativas e as proteções passivas que serão abordadas nos tópicos seguintes.
2- O arco elétrico
2.1 – O que é um arco elétrico?
O arco elétrico é um fenômeno que acontece como consequência de uma descarga elétrica ocorrendo quando a tensão entre dois pontos excede o limite de resistência de isolamento do gás interposto. Na presença de condições adequadas, é gerado um plasma que transporta a corrente elétrica de um ponto a outro, sendo interrompida quando a abertura do dispositivo de proteção no lado da alimentação ocorre. Os gases, que são bons meios isolantes em condições normais, podem se tornar condutores de corrente em consequência de uma alteração em suas propriedades físico-químicas devido a um aumento de temperatura ou a outros fatores externos. Normalmente possui curta duração, sendo menor que 1s [1].
Para entender melhor como um arco elétrico se origina, pode-se fazer referência ao que acontece quando um circuito abre ou fecha. Durante a abertura de uma fase de um circuito elétrico é gerada uma resistência crescente e assim o conseqüente aumento da temperatura. A alta temperatura provoca a ionização do ar circundante, o que mantém a corrente circulando em forma de arco elétrico. O arco elétrico dura até que a tensão em suas raízes forneça energia suficiente para compensar o calor dissipado e manter uma temperatura adequada. Se o arco for suficientemente alongado e resfriado, eventualmente será extinto.
Da mesma forma, um arco pode se originar também por causa de um curto-circuito entre as fases. Um curto-circuito é uma conexão de baixa impedância entre dois condutores em tensões diferentes. O elemento condutor que constitui a conexão de baixa impedância (por exemplo, uma ferramenta metálica deixada após a manutenção nos barramentos dentro do quadro, fiação incorreta ou o corpo de um animal que entrou no quadro) está sujeito à diferença de potencial e passagem de corrente perigosa através de um valor geralmente alto que depende das características do circuito resultante. O fluxo de alta corrente de falha causa superaquecimento dos condutores (cabos ou barramentos) até o ponto de fusão da seção transversal mais baixa. Assim que um condutor derrete, ocorrem condições semelhantes às existentes durante a abertura do circuito. Nesse ponto inicia-se um arco que dura até a intervenção dos dispositivos de proteção ou até que diminuam as condições necessárias para sua estabilidade.
O arco elétrico é caracterizado por uma combinação de intensa ionização do meio gasoso, por uma queda da tensão, e por uma densidade de corrente muito alta no meio da coluna do arco. Também é caracterizado por uma temperatura extremamente elevada (milhares de ° C) localizada no meio da coluna do arco e (em baixa tensão) a uma distância que varia de mícrons a centímetros das extremidades condutoras.
2.2 – Efeitos do arco elétrico
O arco traz consigo diversos perigos associados, tanto para pessoas quanto para o sistema (quadros, partes e cargas).
Ao analisarmos um sistema, principalmente de grandes máquinas elétricas, como transformadores ou geradores, a potência de curto-circuito é elevada e, consequentemente, também a energia associada ao arco elétrico resultante de uma falha. De forma qualitativa podemos descrever a formação do arco dentro de um quadro em 4 fases:
- fase de compressão: nesta fase o volume de ar ocupado pelo arco é superaquecido gerando uma contribuição contínua de energia. Devido à convecção e radiação, o volume restante de ar dentro do cubículo aquece. Inicialmente, existem valores de temperatura e pressão diferentes de uma zona para outra;
- fase de expansão: quando a pressão interna aumenta, é formado um orifício de onde o ar superaquecido pode sair. Nessa fase, a pressão atinge seu valor máximo e começa a diminuir à medida que o ar quente é liberado;
- fase de emissão: nesta fase, devido ao aporte contínuo de energia do arco, quase todo o ar é expulso sob uma sobre pressão lenta e quase constante;
- fase térmica: após a expulsão do ar, a temperatura no interior do quadro atinge quase a do arco elétrico. Esta fase final dura até que o arco seja extinto. Devido às temperaturas extremamente altas, todos os materiais isolantes sofrem erosão/fusão e produzem gases perigosos, fumos e partículas de material fundido no ambiente imediato.
Caso o arco elétrico ocorresse em configurações abertas, algumas das fases descritas não estariam presentes ou poderiam ter menos efeito; entretanto, haverá uma onda de pressão e um aumento na temperatura das zonas ao redor do arco.
Contudo em ambos os processos temos que a temperatura do arco elétrico pode atingir cerca de 20000 °C com níveis de som que podem chegar a 160 db.
Dentro desse cenário, quando falamos sobre os principais perigos aos quais as pessoas estão expostas devido ao arco elétrico podemos citar:
- Queimaduras – os altos níveis de temperatura dos gases e a expulsão de partículas metálicas de um evento de arco elétrico podem causar queimaduras graves de todos os graus.
- Inalação de gases tóxicos – os gases produzidos por materiais isolantes queimados e por metais derretidos ou vaporizados podem ser tóxicos e a queima incompleta destes formam partículas de carbono e outras substâncias sólidas que ficam suspensas no ar.
- Danos à audição – o arco elétrico se manifesta como uma explosão real, com isso gera sons que podem causar lesões permanentes à audição.
- Lesões devido à ejeção de materiais – a ejeção de peças soltas causada pelo arco elétrico pode resultar em lesões nas partes mais suscetíveis do ser humano.
3 – Como Mitigar?
Por se tratar de um problema que pode causar muitos danos, cada vez mais tem-se aumentado a preocupação para reduzir os impactos causados ou mesmo para mitigá-los. As principais formas que temos para fazer isso são as proteções passivas e proteções ativas.
3.1 – Proteção Passiva
O princípio da proteção passiva do arco voltaico é baseado no projeto mecânico do quadro de baixa e média tensão. O design de construção passar ser o responsável por fazer a proteção, aliando robustez para atender as normas e reduzir o risco de que uma pessoa, em pé na frente desse painel com portas fechadas e travadas, seja ferida no caso de um evento de arco elétrico dentro do equipamento.
Quando se trata de quadros de média tensão temos como principal norma a ABNT NBR IEC 62271-200 que define a Classificação de Arco Interno (IAC) para os quadros e esta classe destina-se a garantir um nível de proteção testado para pessoas próximas do equipamento elétrico em condições normais de operação. Já ao se tratar de baixa tensão, além da norma de regras gerais de construção de quadros (ABNT NBR IEC 61439-1) temos também a ABNT IEC/TR 61641 que é um guia dedicado para testes de arco interno em painéis de baixa tensão, neste guia podem ser encontrados os critérios indicados a seguir:
1º Critério: portas e tampas não deverão se abrir, desde que devidamente fechadas;
2º Critério: Partes que podem representar perigo não devem ser projetadas para fora do painel;
3º Critério: Não deverão ser provocadas pelo arco aberturas ou fendas acessíveis;
4º Critério: Indicadores (tecido de algodão) verticais e horizontais não deverão ser inflamados;
5º Critério: O sistema de aterramento não deverá ser afetado;
6º Critério: Confinar o arco à área definida onde se iniciou e não haver nenhuma propagação às outras áreas.
7° Critério: operação de emergência do conjunto tanto potência quanto o controle deve ser possível quando a falha foi reparada e/ou unidades funcionais da área definida com problema ter sido isolada ou a falha removida.
As referências indicadas nas normas tanto de baixa tensão quando de média tensão, ajudam a garantir a proteção para pessoas e trazem atributos específicos para os quadros resistentes a arco como: Estrutura reforçadas para suportar a sobre pressão, caminho preferencia para descarga de gases quentes, segregações para impedir a propagação do arco.
Nesse cenário as proteções ativas vêm para reduzir o tempo de eliminação do arco a fim de diminuir os efeitos negativos deste evento. Existem alguns métodos de proteção ativa dos quais um dos principais são os dispositivos de detecção de arco interno. Estes dispositivos são relés baseados em fazer a proteção através de fibras óticas que detectam o fluxo de luz associado ao fenômeno do arco elétrico. Quando o arco é detectado, ele envia um sinal de trip para o disjuntor abrir o circuito, ignorando a proteção do relé e seus tempos de proteção parametrizados.
Como reles dedicados a fazer proteção e mitigação de arco interno a ABB oferece as linhas de relés REA e TVOC-2, que são linhas que garante uma rápida atuação com tempo de detecção que 1-2ms, e que em conjunto com o disjuntor podem garantir uma abertura de até 30ms. Como indicado no gráfico anterior este também seria um tempo capaz de evitar os principais danos aos equipamentos e principalmente pode salvar vidas, uma vez que um acidente com a porta do quadro elétrico aberta reduzem a proteção que o projeto do quadro traz, ficando a cargo da proteção ativa a segurança do operador. Por essa razão, o sistema de proteção de arco tem se tornado, portanto, uma parte natural de um projeto moderno de um sistema elétrico.
A linha REA101 traz a possibilidade de uso de fibras em loop de até 60m por unidade, trazendo consigo já incorporada a detecção de luz e corrente, que visa evitar o problema de um trip indevido.
A linha TVOC-2 oferece a flexibilidade de conexão de até 30 fibras óticas pontuais, uma IHM de trabalho fácil e intuitivo, bem como a possibilidade de conexão em rede Modbus para facilitar aquisição de informação do ponto de falha e consequentemente maior agilidade na resolução do problema. O TVOC-2 conta também com uma unidade de medição de corrente (CSU-2) que pode ser instalada junto ao relé para ser feita o monitoramento através de luz e corrente, esta unidade pode ser ligada a sensores Rogowski para medição tanto em baixa quanto média tensão.
4 – Bibliografia
[1] Neal, T., Bingham, A. H., and Doughty, R. L., “Protective clothing guidelines for electric arc exposure,” in Conf. Rec. IEEE PCIC, pp. 298–281, Sept. 1996;
[2] IEC/TR 61641:2019 , “Enclosed low-voltage switchgear and controlgear assemblies — Guide for testing under conditions of arcing due to internal fault”;
[2] IEC 61439-1:2011, “Low-voltage switchgear and controlgear assemblies Part 1: General rules”;
[4] IEC 62271-200:2003, “High-voltage switchgear and controlgear Part 200: AC metal-enclosed switchgear and controlgear rated voltage above 1 kV and up to and including 52 kV”;
[5] RESENDE, Filipe Barcelos. PROTEÇÃO ELÉTRICA EM SUBESTAÇÕES: UMA ABORDAGEM SOBRE A ENERGIA INCIDENTE. 2016. 283 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Engenharia Elétrica, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2016.
[6] ABB. Monitor de Arco Elétrico – TVOC-2. 2012. Disponível em: https://library.e.abb.com/public/ab45d28f1ea328d383257ac50044d418/Catalogo_TVOC-2_2012.pdf. Acesso em: 10 set. 2020.
[7] ABB. Arc Guard System – TVOC-2. 2020. Disponível em: https://search.abb.com/library/Download.aspx?DocumentID=1SFC170001C0201&LanguageCode=en&DocumentPartId=&Action=Launch. Acesso em: 10 set. 2020.
[8] ABB. Protection against electric arc Integration between Arc Guard System™ TVOC-2 and SACE Emax2. Disponível em: https://search.abb.com/library/Download.aspx?DocumentID=1SFC170001C0201&LanguageCode=en&DocumentPartId=&Action=Launch. Acesso em: 12 set. 2020.
[9] ABB. Arc Protection Relay REA101. Disponível em https://library.e.abb.com/public/8ded070f2494b38ec2257036003ad165/REA101_oper_751003_ENf.pdfAcesso em: 15 set. 2020.
Peterson Moraes
Engenheiro eletricista pela USP, com pós em Gestão de Negócios. Atua há 8 anos no segmento de distribuição de energia, com experiência em projetos e equipamentos de Média e Baixa Tensão. Responsável por produtos de partida de motores e proteção de Arco na ABB Eletrificação.