Há quase um ano eu escrevi sobre a hora do Brasil mostrar a que veio nesse mercado global de hidrogênio verde que começa a se formar. Continuo defendendo o potencial do Brasil em mais este segmento econômico, mas é hora de atualizar a conversa sobre as oportunidades e desafios para o segmento.
Não digo que não avançamos. O marco legal para projetos de hidrogênio verde passou no Senado recentemente e agora aguarda sanção do presidente. Enquanto isso, diferentes perfis de interessados nessa commodity se reúnem no Ceará para discutir, pelo terceiro ano consecutivo, o impulso que falta para a produção de hidrogênio verde no Brasil finalmente escalar.
Organizado pela Federação das Indústrias do Estado do Ceará e parceiros em agosto, o FIEC Summit dá sequência às conversas entre investidores, empresários, pesquisadores e representantes do governo para desenvolver a produção de hidrogênio verde no Ceará. O estado tem potencial para colocar o Brasil em posição vantajosa no mercado global por sua alta capacidade de geração de energia eólica e solar, localização estratégica do Complexo do Pecém e disponibilidade de área para construção de um hub de produção.
A ABB, que é signatária de um memorando de entendimento com o Governo do Ceará para estimular a produção de hidrogênio verde na região, também participa da conversa no FIEC Summit.
O gerente de engenharia e fábrica da ABB, Felipe Campos, apresenta as possibilidades para eletrólise da água, fundamental para a extração de hidrogênio verde, com os nossos retificadores de alta potência. E no que se refere a mercado, o gerente global de negócios para indústria e hidrogênio da ABB, Jorge Batarce, explora os caminhos para viabilizar financeiramente a produção em escala. Além destes assuntos, a ABB mostrará durante o evento suas soluções de ponta a ponta utilizando principalmente recursos digitais já desenvolvidas para este mercado.
Por falar em avanço, eis o marco legal, enquadrado na Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono. O que foi aprovado na câmara é a definição de um projeto de lei que regulamenta a produção de hidrogênio verde no Brasil. Entre muitas coisas, isso significa principalmente a concessão de crédito fiscal para produtores e compradores de hidrogênio verde entre 2028 e 2032. A previsão é de R$18 bilhões em incentivos fiscais ao mercado neste período de cinco anos.
Os desafios
Recursos e posição no mapa são atributos que podem conferir ao Brasil a posição de player global de hidrogênio verde. No entanto, se por um lado o marco legal significa avanço, por outro coloca uma questão delicada para a cadeia como um todo. Recentemente aprovado pelo Congresso, o texto do projeto exclui uma ampliação que estava prevista dos benefícios às Zonas de Processamento e Exportação, as ZPEs.
Por definição do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, as ZPEs são áreas de livre comércio que foram criadas pelo país para estimular a cultura exportadora e fortalecer a balança comercial. Essas áreas já seguem um regime fiscal específico. Mas o ponto de atenção é que um dos objetivos do PL do hidrogênio verde, nas primeiras versões do texto, era ampliar os incentivos fiscais para toda a cadeia produtiva ligada ao hidrogênio, isto é, dentro e fora das ZPEs.
Além dos desafios relacionados à política industrial, há também uma questão de custos. O índice de preço da consultoria Clean Energy Latin America (Cela) para produção varia entre U$2,87 e U$3,56 por quilo de hidrogênio verde. Com incentivos e otimizações, esse custo poderia ficar entre US$1,69 e US$1,86, um preço altamente competitivo para o país. Isso significa que alcançar essa competitividade passa inevitavelmente por investimentos em alta tecnologia para tornar a produção financeiramente viável.
A produção de hidrogênio precisa escalar por uma questão de oportunidade de mercado para o Brasil dentro e fora de suas fronteiras. Como bem diz a diretora executiva da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV), Fernanda Delgado, a complexidade desse segmento que envolve outras diferentes áreas da indústria demonstra potencial para gerar emprego e renda no país com a criação de novos negócios e funções profissionais.
Se por um lado, o cenário indica que o Brasil está mais perto de concretizar a promessa de potência do hidrogênio verde, por outro, há um caminho desafiador para percorrer no sentido de concretizar as ideias, e as conversas por ora aquecidas não podem esfriar daqui para frente.
Sobre o autor
Renato Martins, Diretor da Divisão de Energia no Brasil